A minha riqueza são minhas recordações. São todas as cartas que tenho guardadas, em uma caixinha, dentro do guarda-roupa. São as letras que eu vejo/leio quando, num domingo, a alma pede sentimento. Ou quando numa tarde, sem mais, sem som, o coração insiste em sentir afago. É de letra que eu faço o amor renascer, de verbos que eu vejo quem um dia eu fui e quem ainda me resta ser.
Eu vou lendo e me perdendo num passado misturado, cheio de sujeitos e seus predicados. Eu lembro de frases que eu dizia, das que eu escutava, e daquelas que me arrancavam lágrimas de amor. Vou percebendo minha evolução ou regressão a partir das palavras que me definiam. As fotografias dentro da caixa vão me fazendo fechar os olhinhos, lembrar de momentos que existiram e daqueles que um dia eu sonhei existir. Mas desisti, abri mão, joguei no ar. Ou, como toda vida vã, foi embora sem que eu percebesse ou permitisse.
As cartas me fazem comparar o que eu já fiz com o que eu faço; o que eu fui com o que agora sou; o que eu nunca aguentei e agora aguento. Eu já nem sei se sei amar como antes, ou se antes era amor. Já pensei em largar as cartas, pela dúvida que elas me trazem, mas não me permiti jogar fora o que de melhor eu já vivi. Sigo lendo, relendo, vez ou outra, constantemente... depende apenas da necessidade que as vezes sinto de me encontrar. Ou me perder ainda mais, quem sabe. Algumas cartas marcaram mais, marcaram datas, marcaram dias. Marcaram o início ou o fim; uma briga ou uma reconciliação. Algumas frases eu anoto em mim, outras eu descarto como quem não quer ler nunca mais, pra esquecer, ou só pra não lembrar.
Hoje é domingo, dia de recordar. Dia que eu escolhi pra me perder e me encontrar. O dia do alívio ou da agonia. É quando eu abro o armário, pego a caixa, fecho os olhos e a encosto no peito. É como se o coração se preparasse para ler as cartas, rever as frases, as fotos, os tickets de cinema, os papeis de chocolate, um rabisco no guardanapo, uma flor de papel, as datas que vivi, as vezes que chorei e o amor que há ali, e ainda que finado, escolhi pra guardar em mim. É o meu tesouro.
Cara, cê escreve tão bem.
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