Páginas

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Maria, o poeta e o mar.

    Quem a via de longe, já reconhecia. Com um fone no ouvido, andava chutando pedras e carregando livros. Levava nas costas umas mochila velha e vazia, dizendo carregar felicidade. Tropeçava a cada três passos, roubava flores secas pelo caminho. Cantarolava Beatles e Jovem guarda, misturava ritmos e letras. Cambaleando e dançando, todos já sabiam: lá vem Maria!
    Maria não fugia de ninguém, a não ser de si mesma. Desafiava o mundo com seus dezessete medos. Fazia poesias com sua própria dor. Criou rimas com palavras novas, fez nascer flores em casas cinzas, cultivou Amor-perfeito em seu jardim. Maria tinha a força de uma mosca e a valentia de um leão. Se contradizia em suas próprias estórias, mas era verdadeira e abusava do senso crítico. Fez viagens sem sair do lugar, e conheceu pessoas de todos os cantos. Sempre buscou aprender coisas novas e fotografava o céu, sempre às cinco e quinze, sem olhos de vidros ou cartão de memória. 
    Toda palavra de amor a derretia, todo coração a pertencia, toda canção ninava. Todo sentimento ela sentia. Se havia frio, tremia. Se houvesse flor, cheirava. Maria tinha medo do devir de tanta gente.  Lia Bukowski e chorava, lia Leminski e sorria. Ninguém entende: "como é que pode, Maria?"
     Feita de sonhos, dormia já acordada. Não tolerava quem confundia fé com vontade e Cristo com religião. Maria nunca quis ser grande, embora já fosse. Um dia, ultrapassou o sinal vermelho e atropelou seus próprios planos. Nesse dia, a lua pareceu menor, o vento foi composto de notas musicais. Às cinco e quinze, o céu chorava... chovia. E enquanto o "mar ia", todos sabiam: lá vai Maria!